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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Revisão bibliográfica sobre as características da cólera.

Caros leitores, segue uma simplificada revisão bibliográfica que fiz sobre cólera. Espero que seja útil

1.1 - Descrição:

            A cólera é uma doença infecciosa aguda, transmissível que se caracteriza por uma infecção intestinal grave, podendo levar à morte em decorrência da desidratação. A bactéria causadora é o vibrião colérico ou Víbrio cholerae.
O agente etiológico da cólera é encontrado nas fezes das pessoas infectadas, doentes ou não. O homem, único reservatório do vibrião, chega a eliminar 10 milhões de bactérias por grama de fezes. O contágio é direto, pela água e pelos alimentos contaminados. As moscas e outros insetos podem funcionar como vetores mecânicos, transportando o vibrião para a água e para os alimentos.

1.2 - Sinais e sintomas:

Após um período de incubação de algumas horas a 5 dias, a maioria dos casos de cólera, apresenta-se como uma diarréia leve ou moderada, indistinguível das diarréias comuns. Podem ocorrer vômitos, porém dor abdominal e febre são incomuns. Em algumas pessoas (menos de 10%), a cólera pode evoluir de forma mais grave, com início súbito de uma diarréia aquosa profusa, geralmente sem muco, pus ou sangue e, com freqüência, acompanhada de vômitos. Poder ocorre perda rápida de líquidos (até 1 a 2 litros por hora) e eletrólitos, levando a desidratação acentuada. Em razão disso, há sede intensa, perda de peso, prostração, diminuição do turgor da pele e os olhos ficam encovados. Há desequilíbrio hidroeletrolítico, o que pode ocasionar câimbras musculares e, em crianças, a hipoglicemia pode levar a convulsões e redução do nível de consciência. Sem tratamento adequado ocorre diminuição da pressão sanguínea, funcionamento inadequado dos rins, diminuição do volume urinário até a anúria total, coma e evolução para a morte em três a quatro horas. Raramente, pode haver concomitância de febre alta (cólera "tifóide") e a perda de líquidos pode não ser evidente (cólera "seca"), uma vez que a desidratação pode se dar por  retenção de líquidos no intestino. O óbito pode acontecer em até 50% das formas graves não tratadas, número que cai para menos de 2% com hidratação adequada.
Na maioria dos casos, manifesta-se de forma assintomática e este é um dos principais motivos que facilitam sua propagação, já que o portador é capaz de transmitir a doença sem ao menos ter conhecimento deste fato. Apenas 10% das pessoas afetadas desenvolvem o quadro sintomático. Os pacientes liberam os vibriões em suas fezes por cerca de vinte dias.

1.3 – Diagnóstico:


A confirmação do diagnóstico de cólera é feita através de isolamento do V. cholerae em cultivo, feito geralmente a partir das fezes. A confirmação não tem importância para o tratamento da pessoa doente, mas é fundamental para a adoção de medidas que reduzam o risco de ocorrência de uma epidemia. É também importante, por motivos semelhantes, se a pessoa doente é proveniente de uma área onde não era antes registrada a ocorrência da doença. Além disso, o isolamento de amostras da bactéria torna possível o conhecimento da sua susceptibilidade aos antimicrobianos.


Fonte: Google imagens

1.4 – Tratamento:


O tratamento da cólera consiste basicamente em reidratação. A desidratação pode ser danosa em qualquer idade, mas é particularmente perigosa em crianças e idosos. Nos casos leves e moderados, o médico pode recomendar que o tratamento seja feito em casa, com a solução de reidratação oral. Existem diversas fórmulas contendo sais que são facilmente encontradas em farmácias, mas as fórmulas que contém a composição recomendada pela Organização Mundial da Saúde devem ser preferidas: Cloreto de sódio 3,5 mg; Citrato trissódico diidratado 2,9 mg; Cloreto de potássio 1,5 mg e Glicose 20,0 mg.
Os medicamentos antidiarreicos, do mesmo modo que em todas as outras diarreias de causa infecciosa,  estão contraindicados no tratamento da cólera. Esses medicamentos diminuem os movimentos intestinais (peristaltimo), facilitando a multiplicação do V. cholerae. Como resultado, ocorre piora ou aumento na duração da diarréia. Do mesmo modo, não devem ser utilizados adstringentes (caolin-pectina, carvão), uma vez que podem perpetuar a perda de eletrólitos (sódio e potássio) pelas fezes. Em crianças, devem ser evitados medicamentos contra vômitos, uma vez que podem ocasionar intoxicação, com diminuição do nível de consciência e movimentos involuntários, dificultando a ingestão da solução oral de reidratação. Além disso, essa medicação é geralmente desnecessária, uma vez que os vômitos tendem a cessar com o início da reidratação.
Na maioria dos casos, mesmo nas formas graves, a recuperação é completa e rápida, apenas com a reidratação adequada. Nas formas graves, os antibióticos quando iniciados nas primeiras 24 horas de doença, podem diminuir a duração da diarréia e, com isto, as perdas de líquido e eletrólitos, o que facilita a terapêutica. Nos casos sem gravidade, o uso de antibióticos não é justificável, uma vez que não trazem qualquer benefício comprovado na evolução da doença ou interferência na sua disseminação. Além disso, o uso indiscriminado de antibióticos aumenta o risco do surgimento de resistência no V. cholerae (e em outras bactérias intestinais), o que pode dificultar o tratamento das formas graves.

1.4 – Aspectos epidemiológicos:

A cólera ocasionou seis pandemias entre 1817 e 1923. A atual, a sétima, começou na Indonésia em 1961, causada pelo biótipo El Tor. Disseminou-se por outros países na Ásia, Oriente Médio, África (70% dos casos notificados no mundo) e Europa, chegando à América do Sul em 1991, através de cidades litorâneas do Peru. Em 1992, surgiu na Índia um novo sorogrupo produtor de enterotoxina, o V. cholerae O139, que rapidamente atingiu o Paquistão, Bangladesh e China. No Brasil, a introdução da cólera (causada pelo El Tor) ocorreu através da  Região Amazônica, no Alto Solimões.
A cólera afeta, principalmente, locais onde o saneamento básico é precário. A bactéria sobrevive por até cinco dias em temperatura ambiente e é resistente ao congelamento. No ambiente marinho, vive bem em temperaturas entre 10 e 30°C. Entretanto, não resiste a temperaturas acima de 80°C e tampouco à exposição ao cloro.

Casos confirmados, por local de transmissão: entre 1996 e 2006. Fonte: Ministério da Saúde 2007
Região
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Total
Norte
81
48
17
0
0
0
0
0
0
0
0
146
Nordeste
936
2.996
2.728
4.279
733
7
0
0
21
5
0
11.705
Sudeste
0
0
0
13
0
0
0
0
0
0
0
13
Sul
0
0
0
467
0
0
0
0
0
0
0
467
Centro-Oeste
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
1
1
Total
1.017
3.044
2.745
4.759
733
7
0
0
21
5
1
12.332

1.5 – Ações em saúde:

            A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o tratamento com 6 mg de cloro para cada litro de água. Quando se utiliza um conta-gotas de 1 ml = 20 gotas, 5 gotas de hipoclorito de sódio a 2,5% contém 6 mg de cloro. O tratamento com comprimidos deve ser feito de acordo com as instruções dos fabricantes, observando-se cuidadosamente as recomendações em relação à concentração adequada para diferentes volumes e finalidades de utilização da água. O cloro (hipoclorito de sódio ou comprimidos) deve ser adicionado à água no mínimo 30 minutos antes da sua utilização como bebida ou para o preparo de alimentos. Em recipientes fechados, a água tratada com cloro pode ser utilizada até por 24 horas. A fervura da água antes do consumo, durante pelo menos um minuto, é uma alternativa segura ao tratamento com cloro e deve ser a preferida quando a água estiver turva. Para desinfecção de frutas e verduras deve ser utilizado 2 ml  (40 gotas) de  hipoclorito de sódio a 2,5% para cada litro de água, ou comprimidos de cloro na concentração indicada pelo fabricante. As frutas e verduras devem ser mantidas  imersas por 30 minutos na água clorada. Em seguida devem ser lavados com água tratada com a concentração de cloro adequada à sua utilização como bebida.
            Vacinas possuem restrições de uso, sendo requeridas apenas como medida complementar, em casos de risco de infecção elevado, em pessoas cujas secreções ácidas estomacais são reduzidas.
Coleta de lixo rigorosa, a fim de evitar a proliferação de vetores; enterrar as fezes longe de fontes de água, quando não houver saneamento básico adequado na região; reaquecimento dos alimentos já cozidos; lavar as mãos constantemente; e evitar alimentos de ambiente aquático de região onde houve surto da cólera, são medidas necessárias.
Para reduzir os riscos, a população deve alimentar-se em locais que tenham condições adequadas ao preparo higiênico de alimentos, além de observar cuidados adicionais. A alimentação na rua com vendedores ambulantes constitui um risco elevado. Os alimentos devem ser bem cozidos e servidos logo após a preparação, para evitar nova contaminação com a bactéria. Os alimentos preparados com antecedência devem ser novamente aquecidos, imediatamente antes do consumo e servidos ainda quentes ("saindo fumaça"). Água mineral gaseificada e outras bebidas engarrafadas industrialmente, como refrigerantes, cervejas e vinhos são geralmente seguras. Café e chás bebidos ainda quentes não constituem risco. Não deve ser utilizado gelo em bebidas, a não ser que tenha sido preparado com água tratada (clorada ou fervida). 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


1 - Cólera no Brasil.Saude soc. [online]. 1993, vol.2, n.1, pp. 3-7. ISSN 0104-1290.  http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12901993000100002.

2 - Cólera e condições de vida da população. Rev. Saúde Pública [online]. 2000, vol.34, n.4, pp. 342-347. ISSN 0034-8910.  http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102000000400005. 


3 -  Centers for Disease Control and Prevention. Imported cholera associated with a newly described toxigenic Vibrio cholerae O139 Strain  California, 1993. MMWR 1993;42:501-3. 



Atenciosamente, Rafael Brandão